segunda-feira, 1 de outubro de 2012

XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM DO ANO “B” DIA 30 DE 09 DE 2012.



QUEM NÃO É CONTRA NÓS , ESTÁ A NOSSO FAVOR.

1ª leitura Nm 11, 25-29.
Sl 19b.
2ª Leitura Tg 5, 1-6
Evangelho Mc 9, 38-43.45.47-48.

A chave de compreensão para as leituras deste domingo: “Ninguém pode ser excluído do serviço que se realiza em nome de Deus”. Em meio às tradições do povo israelita pelo deserto, o livro dos Números apresenta o relato da “partilha” do espírito de Moisés, entre setenta membros do povo. A intenção é que Moisés não tenha que levar a carga sozinho. Com esta decisão de Javé, a responsabilidade fica repartida: cada um dos que receberam parte do espírito que estava em Moisés deveria ser profeta do povo. Portanto, teríamos que atentar para o contexto e intuir as características da tarefa destes personagens.
O Capítulo 11 do livro dos Números fala das etapas da marcha pelo deserto; a narrativa centra-se em uma dificuldade do povo: levam vários meses comendo maná e o povo está enfastiado: “temos a alma seca” (v. 6), “não vemos mais que maná” (v.6b), e com isto vem a tentação de lembrar o tempo de abundancia de comida no Egito. Por aqui podemos intuir a grave dificuldade em que se encontra Moisés. O que fazer para que o povo não continue pensando no Egito? O deserto é um grande desafio. Para trás está o Egito, com sua abundancia, porém também com sua escravidão. Para frente está a promessa de terra, liberdade, vida digna, porém, que precisa ser conquistada às custas de privações, sacrifícios e esforços.
O relato causa admiração porque Javé se encoleriza... É um recurso literário para introduzir a preocupação de Moisés, expressa em uma bela oração de intercessão pelo povo. A solução proposta por Javé é adequada: reunir setenta representantes do povo para repartir entre eles o espírito que estava em Moisés; dessa maneira a direção, orientação e conscientização do povo seria tarefa de muitos e não somente de Moisés.
O espírito doado a todas essas pessoas é profético, isto é, está em função da profecia. É preciso assumir que esta atividade profética está orientada a ajudar o povo a tomar mais e mais consciência do plano de Deus em relação ao povo, a entender o que há realmente por trás disso: Egito e sua abundancia de comida, porém com escravidão, que é o contrario ao plano divino, e o que está à frente: um deserto inevitável, desafiante, mortal, porém, no fim das contas, um meio necessário para chegar à terra da liberdade, terra da promessa.
A qualquer pessoa do povo que, entendendo assim as coisas, “catequizasse” a seus irmãos, nesse sentido deveria ser visto como profeta “autorizado”, não porque houvesse estado necessariamente na tenda do encontro, mas por estar em comunhão com o ideal de Javé. Esse parece ser o caso de Eldade e Medade. Eles não estiveram no momento da partilha do espírito e contudo estavam profetizando. Vem a reação de Josué, o mesmo que mais tarde se encarregará de guiar o seu povo nos trabalhos de conquista e ocupação da terra prometida. Josué não entende ainda que tudo que conflui de maneira positiva na consciência do ser humano, deve ser considerado profeta, e por isso aconselha a Moisés que eles sejam proibidos (v. 28).


Moisés, porém, tendo captado muito bem que no trabalho de libertação do povo todos possuem sua importância, responde a Josué com palavras aparentemente duras, porém que buscam também abrir a consciência de seu ajudante: “oxalá todo o povo fosse profeta” (v. 29); oxalá cada um assumisse com verdadeiro empenho a tarefa de conscientizar-se e conscientizar seu próximo.
Não é exatamente isto que Deus quer e espera? Parece que Josué não estava preocupado com a necessidade de que cada membro do povo tivesse uma consciência bem formada para continuar a caminhada pelo deserto. A preocupação era mais em defender “o oficial”, o “autorizado” por Deus na tenda de encontro, isto é, o “instituído”, a defesa dos “direitos de Deus”.
Na mesma linha, o evangelho de Marcos apresenta para este domingo uma situação semelhante, vivida pelos discípulos de Jesus. Há pouco tinham aprendido de Jesus a lição sobre quem seria o maior (Mc 9,33-37), produz-se um incidente que tem a ver com a idéia de exclusividade dos membros do grupo seguidor de Jesus. João conta a Jesus que haviam impedido a um homem de expulsar demônios em seu nome porque não era membro do grupo (v. 38).
Não há uma pergunta, como fazer em casos semelhantes; que posição assumir, etc. A resposta de Jesus é sabia: “ninguém faz um milagre em meu nome e depois fala mal de mim” (v. 39) e “o que não está contra nós, está a nosso favor”. Na tarefa de construção do reino ninguém tem exclusividade. Talvez os discípulos não tinham claro ou não recordavam que sua pertença ao grupo de Jesus foi um dom de pura gratuidade; ninguém deles apresentou diante de Jesus uma relação de méritos para ser elogiado; foi Jesus quem se apresentou a eles, interpôs-se no caminho de cada um e os chamou, mesmo sabendo que não eram os melhores nem os mais representativos da sociedade.
Nesse sentido, outros ainda continuam sendo chamados. Em cada homem e em cada mulher, Deus semeou as sementes do bem; como e quando essas sementes começam a germinar e dar frutos, isso é decisão de cada um. Às
vezes nos parecemos com João e o resto dos discípulos, reagimos com quem, sem pertencer à instituição, faz obras melhores que as nossas. E sai imediatamente a frase: “mas esse ou essa pertence a tal ou qual religião, ou de tal ou qual grupo...”. Muitas vezes os nossos interesses mesquinhos, critérios de autoridade e de exclusividade, rejeitados por Jesus (cf. Mc 9,39), se sobrepõem à vocação universal de fazer o bem e à prática do amor.
O diálogo de Jesus com seus discípulos reflete a situação da comunidade para a qual Marcos escreve seu evangelho. Uma comunidade muito consciente do que eram as exclusões, porém ao mesmo tempo correndo o risco de ser exclusivista, com a aparência de coisa boa: “ser ou não ser dos nossos”. “ser ou não ser do caminho”, “estar ou não estar no processo...” e, enfim, outros argumentos que pretensamente tentar justificar a desculpa de defender a “pureza” da fé ou do “credo” ou da “ordem” ou, enfim, de “defender os direitos” de Deus.
Pois bem, quando se cai no extremos de “defender” a Deus, ou os “direitos” de Deus, o que se pretende é minimizar a Deus, colocá-lo no ridículo ante o mundo e a consequência mais imediata, a que previu Jesus e que talvez já estava presente na comunidade primitiva: o escândalo para com os pequenos. Jesus se preocupa com os “pequenos”, não somente os menores de idade, mas os que apenas começam a intuir a dinâmica do reino com a subsequente imagem de Deus que ele propõe.
Contudo, através dos séculos, os perigos da comunidade primitiva se convertem em fatos reais: quantos crentes promotores do bem, da justiça e da paz foram excluídos ou silenciados somente porque “não eram dos nossos”, quantos Josués e Joões “defenderam” uma pretensa exclusividade que certamente ninguém possui, mas que serve apenas para escandalizar cada vez mais a muitos fazendo-os crer que Deus é tão pequeno a ponto de ser reduzido aos estreitos limites de um grupo ou de uma instituição, ainda que seus adeptos sejam contados aos milhares.
Se conseguimos tomar consciência de que Deus é maior que um grupo ou uma instituição e que em nenhum momento nossa vocação é a de defender supostos direitos de Deus, mas simplesmente servir, colocar-se a serviço da construção do Reino, a partir das múltiplas possibilidades que isso implica, dada a insondável riqueza do mesmo espírito, então jamais podemos pensar se este ou aquele é ou não é “dos nossos”, mas ... como cooperar mais e melhor com aquele ou aquela que tão bem estão lutando por construir aqui o reino!
Pe. Rosevaldo Bahls.
Cascavel, 25 de 09 de 2012.

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